quinta-feira, 7 de novembro de 2013

SOBRE HUMANOS E MÁQUINAS

(Edson Leão)
Acordar
Se sentindo mal na foto
Algo meio: retrato três por quatro
Em documento de olho esbugalhado
E cabelo lambido, mal acomodado.
Ter que sair pelo dia assim
Ignorar do elevador
O riso entre dentes
Enquanto fecha a porta
E finge obedecer ao teu comando
Quando sabe que você
Não tem mesmo outra escolha
Senão seguir com ele até o térreo
Para ser humilhantemente exposto
Ao voyerismo
Das câmeras de segurança do prédio.
Cada botão que apertas
Sente em tuas mãos trêmulas
O inferno que levas, clandestino.
Agora é bater o portão
Ganhar a rua
Submisso ao bullyng das buzinas
Sentindo como se todas as coisas vissem
O amarrotado explícito em teu espírito
Como quem dormiu com a roupa de sair
E não teve tempo de trocar de pele e fardo
Como quem expõe em pêlo, o pensamento
Frente à cidade
E seus olhos de impiedade.
Os postes cochicham ao teu passar nas calçadas
As janelas de edifícios “paparazzam” sua alma.
É preciso manter a calma
Não pensar no que os carros comentarão
Em assembléia extraordinária
Nas garagens e estacionamentos
Posto que as máquinas
Tudo sabem
Daquilo que nos vai por dentro
Feitas à nossa imagem
E semelhança
Seres programados
Para tarefas rotineiras
Repetitivas, mecânicas
De existências sem sentido
Sem muito mais que fazer
Do que debruçar-se
Com vista privilegiada
Sobre a comédia e a tragédia
Que encena a existência humana
Criaturas
Destinadas ao descarte
E ao oculto mistério
Sobre o que afinal as aguardará
Após partirem desta
Para algum irremediável
E inoxidável destino
Além dos muros
De um inexorável
Deletério
E faminto
Depósito de ferro velho.

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