quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

SEM BANDO



(Edson Leão)
Faço parte do bando dos que não têm bando
E por isso, apenas mantém o silêncio
Quando se esbarram na multidão
Com outro ou outra, que também faz parte
Do bando dos que não cabem
Na fôrma deformadora de um bando
Mas se reconhecem pelo andar
E pelo olhar que desvia o olhar
Enquanto seguem no anonimato da multidão
Como se mergulhassem num mar
Enquanto seguem a sós com suas botas
E um velho agasalho de estrada
Diluídos entre os edifícios
Uma espécie diferente, vestida igual
Animais desconhecidos, camuflados na fauna
Bebendo na porta de um bar
Pedindo um pastel e um caldo
Lendo as manchetes dos jornais na banca
Como se o futuro da raça lhes importasse
E eles verdadeiramente se importam
Se importam que as multidões se salvem
Mesmo julgando não pertencer a elas
Mesmo sabendo-se albatroz no convés
Mesmo dançando um blues, como um bobo da corte
Em um samba-canção, eles salvariam o mundo
Ou só fumariam mais um cigarro, ou um maço
Vendo em meio a paisagem a multidão
Os carros derretendo num forno
As pessoas saqueando as lojas em meio ao caos
Ou simplesmente vendo a garota dançar um funk
E o moleque com a crista de galo,
Igual a do jogador de futebol do cartaz
Talvez só tivesse um enjôo ao sair do cinema
Depois de ver o mais novo filme de Hollywood
Abusar de sua inteligência
Feito uma propaganda nazista
Talvez ele só tomasse um chopp
Olhando as pernas cortando o calçadão
Ou a bela mulher magra
Dependurada em embrulhos
Olhando o nada com olhos cansados
Como se a vida sugasse sem sentir
Sua juventude e seu tempo, pelos dedos
Cujos poros são parasitados
Pelos embrulhos que abraça
E leva pros filhos que a esperam em casa...
Mas eu faço parte do bando dos que não têm bando
E nada disso me importa de fato
Um dia vou apenas desaparecer
Como um avião na curvatura do espaço
E escorregar para a borda oculta do verso
Até que de mim já não sobre nem palavra...